quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

Romaria


“- O que é uma romaria?”
Em termos meramente humanos, poderia dizer que é um caminhar, algumas vezes penoso, doloroso e até em condições voluntariamente precárias, mas cheio de encantos. Já em termos espirituais, poderia dizer que é um retiro, não entre quatro paredes mas sim ao ar livre, no qual nos encontramos com Ele seguindo-O como Sua Mãe.

No entanto para aqueles que nunca fizeram esta caminhada é um pouco difícil perceberem esta simples explicação, e aqueles que já a fizerem, por muito que lhes tentem explicar, os primeiros muito dificilmente conseguirão compreender. Uma romaria é algo que se vive dentro de nós, na nossa alma e não existem palavras suficientes que consigam explicar isso.

Desde sempre que faz parte do ser humano a necessidade de se transcender, de se superar e de andar à procura do absoluto. Esta necessidade é um fenómeno que apareceu ainda antes do Cristianismo.

Após a Ressurreição de Cristo, os crentes começaram a fazer caminhadas aos principais centros do cristianismo. No início dirigiram-se a Jerusalém e eram chamados de palmeiros, por causa dos ramos de palma presente nos oásis do deserto. Ramos esses também usados na Sua entrada em Jerusalém. Com a expansão do islamismo naquela zona no século XI, os muçulmanos começaram a criar dificuldades para que os palmeiros pudessem visitar a Terra Santa, passando inclusivamente a persegui-los. Tendo em conta essa situação, muitos começaram a ir aos túmulos de Pedro e Paulo, como meta, passando a designarem-se de romeiros, porque iam a Roma, local onde tinham sido mortos estes primeiros apóstolos. De certa forma, a capital do império romano tomou o lugar de Jerusalém. Aliás, Roma naquele tempo, quis mesmo chamar-se “nova Jerusalém”. A partir do século XII começaram a aparecer os peregrinos, nome dado ao que se punham a caminho de Santiago de Compostela.

Qualquer uma dessas caminhadas, tinham e têm como único objetivo ir rezar a um determinado lugar, se bem que durante o percurso possam também rezar. Uma caminhada assim, não é só um ato de fé, mas também de audácia e coragem. Palmeiros, romeiros e peregrinos, têm em comum a experiência da memória de uma viagem inicial e fundadora, semelhante há que Abraão fez quando saiu de uma terra à procura de um algures, que uma voz lhe indicara.

Após esta pequena introdução, então porque se deu o nome de romaria a esta singular peregrinação cristã[1] que ocorre em algumas ilhas dos Açores, sendo mais antigas as que se realizam na Ilha de São Miguel?

Em termos históricos poderá haver alguma razão ou fundamento para esse facto que desconheço, no entanto, gostaria de entrar num campo meramente poético da minha parte, mas que religiosamente poderá fazer algum sentido. Assim, o termo romaria, vem do tempo em que iam a Roma aos túmulos dos primeiros apóstolos ali sepultados, e se Pedro é a Pedra sobre a qual Jesus Cristo edificou a Sua Igreja[2] então foi o sucessor da Pedra angular[3]. Nesta minha lógica poética, o termo terá sido adotado pelos irmãos naquele tempo, porque é essa pedra angular que seguiam e ainda hoje seguimos, como pecadores assumidos, uma vez que Ele caminha connosco no Crucifixo que o menino[4] da cruz leva consigo à frente do rancho. Curiosamente, as nossas orações apesar de serem dirigidas a Maria, Sua e nossa Mãe, a sua simbologia é cristológica. Segundo o Padre Luís Leal, “o culto mariológico aparece como sinal de mediação, apresentando Maria como ‘indicadora e apontadora’ do caminho para Cristo”.

Termino esta lógica poética, dizendo que a palavra escrita romeiro está quase perfeita. Quase perfeita atendendo à explicação no parágrafo anterior, a palavra escrita deveria ser roMaria, porque caminhamos até Roma por Maria.

8 de dezembro de 2018

Paulo Roldão
(Um irmão romeiro, como os demais)



[1]             - Titulo do livro do Padre Agostinho Pinto
[2]          - Mt 16,18
[3]          - 1Pe 2, 4:8
[4]          - Mt 19, 14

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