“Uma
epidemia de peste alguns séculos atrás... Os bois puxam as carroças cheias de
cadáveres ainda quentes em direção às valas cheias de cale viva. Já não há
ninguém para benzer os mortos desde a morte do padre da paróquia que visitava
os doentes.
O
jovem malabarista da aldeia começa a temer pela sua vida. O que será da sua
mulher e do seu filho pequeno se também ele apanhar a peste? Resolve começar a
rezar.
Esgueira-se
para dentro da igreja que só costuma frequentar na Páscoa, como obrigam os
mandamentos. Ajoelha-se diante do altar; mas, como rezar? O que é que pode
dizer ao Deus todo-poderoso, esse juiz austero?
Então,
para em frente duma estátua de Nossa Senhora e tenta recitar uma Avé Maria, mas
a última vez que o fez foi há muito tempo. As palavras da curta oração
escapam-lhe, já para não falar das lengalengas da sua infância.
"Vou
rezar com as minhas próprias palavras", diz o pequeno malabarista a si
próprio. "Vou falar com a Virgem Maria com o coração. Também ela vivia
numa aldeia." Mas o jovem malabarista não tem jeito para as frases bonitas
que gostaria de dizer. Está mais habituado a assobiar às raparigas e a dizer
palavrões. Fica mudo.
De
repente, resolve: "Vou fazer aquilo
que sei fazer melhor. Vou fazer malabarismos para Ela!" Tira as bolas
do saco e começa a fazer malabarismos, ali mesmo, na capela Mariana, vazia.
Primeiro devagar, depois mais rápido, uma, duas, três bolas que lança cada vez
mais alto, até ter cinco, seis, sete bolas nos ares, que dançam como os
planetas nas nuvens intergaláxicas, tal como as luas de Júpiter.
De repente, surge o sacristão
sem aviso, grosseiro e com a cara corada. Enterra a vassoura que traz na mão na
barriga do malabarista e exclama: "Sabes
onde estás, imbecil?! Sabes, não?! Mas a estátua de Nossa Senhora descontrai e
sorri e depois ri às gargalhadas. E do seu pedestal, inclina-se para o pequeno
malabarista e limpa o suor da sua testa com a palma da sua mão.”[1]
Este
pequeno artigo no sítio em referência
fez-me recordar a Celebração Eucarística seguida da procissão de velas ocorrida
no passado dia 12 de maio.
A
casa
de
nossa senhora estava cheia, a celebração em si foi fenomenal, mesmo com
a chuva que teimava em cair abundantemente lá
fora, na rua e o sermão proferido
pelo Padre Dolores soberbo e apelativo à leitura do Tratado da Verdadeira
Devoção à Santíssima Virgem[2].
A
imagem de nossa senhora em cima do seu andor estava com a simplicidade e humildade
previstas, como ela o foi, como ela o é. A procissão estava preparada, os
escuteiros iam entregando as velas nos recipientes improvisados para a cera não
queimar as mãos. Atendendo ao tempo que tinha ocorrido durante a noite e ao que
estava no momento, a procissão iria ser especial e peculiar.
Especial
por ter ocorrido entre as quatro paredes do santuário, onde os cânticos
marianos criaram uma ressonância própria, melodiosa e relaxante. Onde os
cânticos marianos roçaram ligeiramente o céu e alegraram os anjos que ali
estavam presentes.
Peculiar
porque no meio de tantos devotos de Maria apenas uma pessoa[3]
acenava-lhe com um lenço branco e com algumas gotas de água pura no canto do
olho, vivia a presença da rainha dos céus e da terra. Admito que na altura
achei uma tolice, por ser a pessoa que era, mas após ter lido o texto referido
no primeiro parágrafo, senti que tinha agido quase como o sacristão, e afinal a
pessoa em questão apenas tinha feito aquilo que sabia fazer melhor.
Se calhar talvez fosse o único que sabia realmente
onde estava e a ele Nossa
Senhora descontraiu e sorriu-lhe.
Paulo Roldão
(um irmão
romeiro, como os demais)
[1]
Transcrição de http://www.lugarsagrado.com/ datado de 27 de junho de 2012
[2] O mesmo
poderá ser descarregado em http://abcdacatequese.com/partilha/partilha-de-recursos/doc_details/2011-tratado-da-verdadeira-devocao-a-santissima-virgem-de-sao-luis-maria-de-montfort
[3] São
Mateus 19,14
1 comentário:
Gostei muito e a história do malabarista é enternecedora.
Um abraço amigo em Cristo
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