terça-feira, 29 de março de 2011

O que faz caminhar o Romeiro?

"Uma Romaria não é tarefa fácil até pelo contrário é difícil, e penosa mesmo. Então se é assim tão draconiana porque a repetem todos os anos? Boa pergunta, pensarão… Não se trata de um passeio em redor da Ilha, mas de um verdadeiro retiro em movimento, contra os elementos quer sejam favoráveis ou não, chovendo ou fazendo nevoeiro ou sol calmo ou abrasador o caminho é seguir em frente orando incessantemente sem despudor nem respeito humano porque, orando se aprende a orar, como numa oficina. A oração, é a alavanca da Romaria, quer recitada, quer cantada, é ela que nos dá ânimo a continuarmos quando muitas vezes o corpo clama por repouso, mas há que continuar sem desfalecimentos porque mais à frente está o que buscamos apesar da dor, desconforto, cansaço, exaustão. O primeiro dia é o mais fácil mas mesmo assim calcorreamos cerca de 60 quilómetros pelas estradas da nossa Ilha, subindo e descendo em busca do Senhor porque a Romaria é encontro marcado com Ele que se manifesta de maneiras diferentes para cada um de nós. A razão mais importante da caminhada incessante é o encontro com Jesus – é a razão única. E como se dá esse encontro? De muitas maneiras e de diferentes modos para cada irmão Romeiro. Ele vai-se tornando visível á medida do aumento do sofrimento, caminhando penosamente mas alegremente ao Seu encontro. Há medida que os pés e as pernas forem inchando com a inclemente caminhada, quando do aparecimento das primeiras “bolhas” e a cevadeira se torna demasiado pesada qual cruz em direcção ao Calvário aí ele aparece-nos no rosto de cada Irmão e que satisfação e alegria. E como é que Ele nos aparece perguntarão? À medida que os quilómetros forem passando sob os nossos pés tornamo-nos mais sensíveis que nunca, pequenas coisas que nos passam despercebidas no dia-a-dia tornam-se de uma importância vital mesmo transcendente. São centenas de pessoas que se abeiram de nós nos caminhos da nossa terra, corações empedernidos que ao nos verem passar se comovem até às lágrimas pedindo orações para as suas aflições porque vêm-nos homens penitentes em oração. A Sagrada Escritura diz-nos que nos pobres devemos reconhecer os traços do Cristo Sofredor. A Cristo não se vê, mas quem vê uma pessoa aflita vê Cristo, ou seja o pobre é o “lugar” onde resplandece o rosto de quem procuramos - o Senhor. ü As crianças que se abeiram de nós muitas delas fruto duma desorganização moral e familiar. São o rosto do Senhor; ü Os jovens desorientados por não encontrarem lugar na sociedade, frustrados pela falta de emprego. São o rosto do Senhor ü Os trabalhadores rurais, frequentemente mal pagos e com dificuldades em defender os seus direitos. São o rosto do Senhor ü Os desempregados, despedidos pelos frios cálculos económicos. São o rosto do Senhor ü Os idosos, cada dia mais numerosos, marginalizados pela sociedade porque já não produzem. São o rosto do Senhor ü Os esquecidos, abandonados, marginalizados, fracassados, órfãos e todos os necessitados. São o rosto do Senhor É na Romaria que se vê o verdadeiro rosto do Senhor porque estamos mais atentos e sensíveis. Os seus traços começam a tomar forma ao fim do 3º dia a partir daí tudo está mais fácil porque visivelmente acompanha-nos em cada Irmão Romeiro até ao Santuário de sua Mãe Santíssima que nos viu partir cheia de esperança. João Dinis Joaodinis1953@yahoo.com.br"


Artigo publicado no Jornal "A União" datado de ontem.

O mundo interior do romeiro

"Há dias atrás, numa das reuniões preparatórias para a romaria (abertas a todos aqueles que queiram participar) um dos irmãos comentou ter lido o livro que dá pelo nome de “O Tesouro escondido” de José Tolentino Mendonça, no qual dividia as pessoas em dois tipos. As pessoas cebolas e as pessoas batata. A fracção de segundo que mediou entre a citação e a argumentação deu para todos os presentes ficarem a pensar na lógica daquela afirmação, aparentemente ilógica. “Realmente, se alguém nos fizesse a pergunta: “- O teu mundo interior é uma cebola ou uma batata?”, ficaríamos com um sorriso amarelo, por acharmos a pergunta descabida, no entanto, a mesma colocar-nos-ia perante uma verdade nua e crua. Tudo será como a interpretarmos, isto é, tudo são cascas de cebola, modos de ver, perceptivas ou outras situações. A visão cristã deverá estar do lado da batata porque defende que, “mesmo escondida por uma crosta ou por um véu, está uma realidade que é substanciosa e vital.” Claro que, mesmo sabendo que a vida é uma batata, nós vivemo-la, muitas vezes, como se fosse uma cebola. Vivemos muito de opiniões, de verdades (que são tudo menos isso), de modas e de aparências. Como uma cebola desfilamos cascas e camadas, sem um centro que nos dê realmente acesso ao pleno sentido da vida.”[1] Posta esta adaptação constato que nas nossas imperfeições humanas, muitas vezes somos levados a sermos mais cebolas do que batatas. Muitos de nós, sem nos apercebermos, vivemos de modas e aparências e, qual cebola, vamos tirando camada após camada até à última camada e não encontramos nada de palpável, nada que dê sentido á vida, principalmente no fim da vida (ou melhor dizendo), no fim desta vida, passagem para a outra, a eterna, se formos dignos. Alguns de nós até poderão ser apenas chalotas, ou seja, com menos algumas camadas, no entanto, por muito poucas que sejam essas camadas, no fim continuamos a não encontrar nada. O ser batata, como o ser cristão, não é fácil mas, não é impossível, basta um pequeno esforço, um pequeno passo seguido de outros mais. Passos que começam com o baptismo seguindo-se do restante caminho cristão, caminho que pode passar pelas romarias quaresmais, peregrinando lado a lado com outros irmãos, “percorrendo nas estradas de hoje o antiquíssimo labirinto penitencial que as catedrais tinham gravado: redescobrindo pelo apagamento a verdade do que se é; experimentando na pobreza o sentido do que se possui; reinventando na errância o endereço das construções sedentárias que nos motivam; medindo no eterno a direcção do provisório.”[2], rezando e cantando o terço quase incessantemente, como quem mastiga e remastiga as ave-marias, qual caroço de azeitona com que vamos brincando na boca durante o dia.[3] Olhando para a sociedade em que vivemos, reparo que cada vez há mais cebolas, chalotas e cebolinho, muitas delas por força do ambiente em que vivem ou por força dos falsos valores que lhes impõem como sendo os verdadeiros. Felizmente que muitas dessas cebolas, aos poucos vão conseguindo separar o trigo do joio [4]e por uma qualquer metamorfose conseguem passar ao estado de batata. Sem ser utópico, que benéfico será para a sociedade, se um dia (desejo que seja em breve) todos nós vivermos apenas com um pequeno véu e por detrás desse véu houver substância vital e verdadeira. Aliás, enquanto a cebola, depois de tiradas todas as camadas chegamos ao nada da sua existência, a batata depois de se lhe tirar o véu, qual noiva no altar, deparamo-nos com a verdade da sua existência, com a substância do seu conteúdo e, ao contrário do nada da cebola depois de tiradas todas as camadas, a batata depois de se lhe tirar parte do véu e ser lançada à terra morre…mas depois dá muito fruto.[5] [1] Adaptação pessoal de um excerto do livro em causa e que poderá ser consultado em http://www.readoz.com/publication/read?i=1033801. [2] Texto na integra em http://tribodejacob.blogspot.com/2010/02/todos-os-labirintos-comecam-e-terminam.html [3] Alusão ao livro de Erri de Luca, que dá pelo titulo de “Caroço de azeitona” [4] Mt 13 24-30 [5] Jo 12 24 "


Artigo publicado no Jornal "A União" de 24 do corrente mês.

quinta-feira, 24 de março de 2011

segunda-feira, 14 de março de 2011

Romaria para crianças teve lugar em angra

Artigo publicado no Jornal "Diario Insular" do fim de semana, adaptado.
"Cerca de oitenta crianças participaram ontem domingo, numa romaria que foi percorrer todas as igrejas e ermidas da zona de angra do Heroísmo. As crianças que participaram na romaria concentram-se no sábado à noite para fazerem uma vigília no santuário de Nossa senhora da Conceição e ontem, a partir das 07h00, vão efectuaram o percurso com cerca de dez quilómetros. Por seu turno, o grupo de romeiros de Nossa senhora da Conceição, formado em 2007, vai fazer a sua peregrinação anual na Terceira de 30 de março a 03 de abril. "

quinta-feira, 3 de março de 2011

O compromisso com Cristo dos Romeiros perante a sociedade

O compromisso com Cristo dos Romeiros perante a sociedade
(artigo publicado no Jornal "A União" de hoje)
"Um título que também se pode aplicar aos restantes movimentos da igreja, bem como a todos os Cristãos no geral, sendo com base neste título que pretendo hoje escrever algumas palavras, seguramente (como sempre) com a ajuda do Espírito Santo.

Estas opiniões pessoais (que não passam disso mesmo) sobre este movimento do qual faço parte “de alma e coração” e que tenho vindo a escrever ao longo dos últimos tempos, têm dois propósitos. O 1º é interno, ou seja, tento (se calhar sem o conseguir) que os restantes irmãos ao longo do ano que medeia entre o fim de uma romaria e o inicio de outra, continuem a sentir a chama do Amor de Cristo mas também a sentirem a lenha da oração a crepitar na Alma, como acontece comigo. O 2º é externo, isto é, com estes artigos (uns “tolos” e outros mais “discretos”) tento (muito possivelmente sem o conseguir) que os homens de Deus sintam vontade e, eventualmente, no murmúrio de uma brisa suave
[1], a experienciarem um singular e sui generis retiro espiritual, como é uma romaria.

Depois desta divagação, e de volta ao que me propus escrever, ao assunto em si mesmo, vem no seguimento da constatação (minha e demais irmãos romeiros) de que, ao longo destes quase 5 anos consecutivos de romarias na Terceira, o número de irmãos não ter aumentado muito, como seria o esperado ou melhor dizendo, como gostaríamos que fosse (mas quem sabe?) ao contrário do propósito de Deus. No entanto, como todos nós somos Cristãos, pedras vivas do Evangelho
[2], é nosso dever e nossa obrigação semear [3]a Sua palavra, mesmo que essa palavra seja do tamanho de um grão de mostarda[4] e, sendo assim, por “muitos” irmãos romeiros que possamos ser, sinto que somos sempre poucos para trabalhar na messe do Senhor[5]. Mas então “onde estaremos a falhar?” – Poderão alguns irmãos perguntarem-se neste momento.
Pessoalmente e com sincera humildade, sinto que não estamos a falhar em alguma coisa significativa, contudo, poderemos sim, ter que limar algumas arestas aqui ou ali.
Penso, isso sim, que a situação talvez resida no facto da casa do Pai ter muitas moradas
[6] e, levando um pouco à letra (é certo) esta passagem bíblica, cada uma dessas moradas poderá ser neste mundo, cada um dos movimentos da igreja e, como tal, nem todos os homens são chamados por Deus para as mesmas coisas. Uns possivelmente completam os outros (quais peças de um puzzle maior) e no todo conseguem que a cruz permaneça de pé, enquanto o mundo gira[7].
Também penso que a situação talvez também resida no facto de uma grande maioria de Cristãos (e que me perdoem os que possam sentir-se ofendidos) não se quererem comprometer verdadeiramente com Cristo, perante o meio e a sociedade onde estão inseridos. Vão a quase todas as missas dominicais, confessam-se regularmente e até por vezes rezam, no entanto, nesta falta de verdadeiro compromisso com Cristo, quase que os equiparo à nova forma de estar da maioria dos políticos, ou seja, são os denominados independentes. Agem como árvores altas e esguias que vergam para o lado que o vento sopra e nisso o Evangelho é bem claro: - Ninguém pode servir a dois senhores
[8]. Em suma, não são “nem sim, nem não”, são nim e variam de tonalidade conforme a hora e o local e é nisto que reside o facto de, por muito que nós romeiros convidemos outras pessoas para nos acompanharem como irmãos, estes nunca negam o convite mas, chegados os dias de reuniões, não comparecem e nos dias seguintes “esqueceram-se” ou “não puderam comparecer”.
Alguém já disse que “Os romeiros rezando pelos caminhos da Ilha incomodam muitas pessoas, sejam cristãos, de outras religiões ou até ateus mas, incomodam principalmente os primeiros” Se realmente incomodam, quando a mim só deverá ser pela atitude de compromisso com Cristo perante a sociedade.

Mesmo com mais alguns talvezes, tenho uma certeza! Deus sabe a altura certa de enviar mais homens para esta morada porque, só mesmo Deus para ser louco o bastante, ao ponto de ter conseguido levar um punhado de homens a palmilhar os caminhos desta ilha (…)
[9].

[1] 1 Rs 19, 12-13
[2] 1Pe 2, 5
[3] Mt 13, 14,20
[4] Mt 13,31-32
[5] Mt 9,38
[6] Jo 14, 2
[7] “Stat crux dum volvitur orbis” – Lema Cartusiano
[8] Mt 6, 24-34
[9] Excerto do artigo publicado no Jornal “A União” em 10/10/2009, e (re) publicado também em http://romeirosterceira.blogspot.com/2009/10/as-romarias-servem-tambem-para-isso.html"