quinta-feira, 4 de março de 2021

2º DIA DE ROMARIA – VISÃO DO IRMÃO LEMBRADOR DAS ALMAS – PRIMEIRO TERÇO

 

E tendo como sempre pela nossa banda esquerda, esse mar que nos é comum, situemo-nos, pois, com se estivéssemos lado a lado junto ao nosso irmão de ala, com o nosso bordão e terço, em cada uma das nossas mãos, carregando sobre os ombros a cevadeira, o xaile e o lenço que nos protege, seguindo ao ritmo dos irmãos guias e da «Cruz bendita», que à frente segue abraçando o Menino da Cruz, o nosso irmão mais novinho que a todos nós protege.


Do meu testemunho, para este nosso 2.º dia de Romaria, consagrar na minha perspectiva de missão, no desempenho da função de «Lembrador das Almas» do nosso Rancho e será nessa centralidade, que procurarei partilhar com os irmãos, essa mística, se bem que a conjugação de algumas das emoções que ocorrem sejam por vezes difíceis de as poder descrever em texto.


Os ponteiros no meu relógio marcam 3 horas, partilha-se do silêncio do lugar, ao suave respirar dos irmãos, ainda em merecido descanso, retemperador do primeiro dia de romaria. Aqui e ali, escutam-se roncos vindos de algumas direcções, o ressonar, tradicional na nossa espécie, mas insuficientes para domarem a calma que reina quase em absoluto na casa. Pé ante-pé e sem provocar ruído, rumo à Atafona, sem antes ter cuidado da minha higiene.


Estou já junto ao carro de bois e à sua seve de bodo, acendo o lume para aquecer o café da manhã, também o leite e o chá de nêveda, que na véspera e ao final da noite, havia reconfortado das energias gastas nos caminhos já percorridos da romaria.


São já 4 da manhã, hora da alvorada, a indicada pelo Irmão Mestre e Contramestre, para que todos os irmãos se levantem, se arrume o espaço que fora berço abençoado do corpo, tempo de colocar-se as cevadeiras, o xaile e lenço, e os terços, tomar-se o primeiro alimento deixado pelas mulheres e homens que tão bem nos têm recebido em todos os santos anos, na sede do seu Grupo Folclórico, agora também tornada «Casa de Romeiros».


Estamos prontos para seguirmos para o nosso segundo dia de romaria, o irmão Mestre dá o sinal com o sininho e à saída, junto ao pequeno portão, um a um vão beijando a Cruz que nos há de guiar com segurança até ao nosso novo destino.

Escuta-se a voz do irmão Mestre:


Bendita foi a hora e o Dia

Em que o Anjo São Gabriel

Desceu do Céu à Terra

Anunciando essas doces palavras

Avé Maria …

Santa Maria


E partimos:

Quase a chegarmos à Igreja, das Doze Ribeira, que tem como patrono São Jorge, ao passarmos junto ao cemitério da freguesia, lanço a «Salva» interrompendo, no momento certo, os irmãos que na frente entoam a Avé Maria …


Seja sempre Bendita e Louvada

a Sagrada Paixão, Morte e Ressurreição

de Nosso Senhor Jesus Cristo!”


Os demais irmãos respondem:


Seja pra sempre Louvada com Sua e Nossa Mãe Maria Santíssima!”


E eu na minha missão digo:


Em honra e glória do mesmo Senhor

Aplicado por aquelas almas benditas do purgatório

Principalmente por aquelas que não têm ninguém que reze por elas

Lembremo-nos nós por amor e caridade!”

Pai Nosso, Avé Maria


Em honra e glória do mesmo Senhor

Recordemos o Nosso Saudoso

Irmão David Fagundes

Que tão cedo nos deixou

Pedindo ao Pai e à Nossa Mãe Maria Santíssima

Que o tenham acolhido em Santa morada!

Pai Nosso, Avé Maria




E assim, caros irmãos, esse ritual se repetirá sempre que passarmos junto a um cemitério:


O levantar-se a «Salva» é sempre um momento de grande emoção interior, porque mais do que as palavras ditas, nos situam na memória dos entes queridos que já partiram;

Nos emociona também, pelo facto de estarmos a lembrar de tantos irmãos, que tendo já partido para o Pai, não recebem muitas vezes um gesto de gratidão e de saudade por parte daqueles que aqui foram seus familiares:


Em honra e glória do mesmo Senhor

Aplicado por aquelas almas benditas do purgatório

Principalmente por aquelas que não têm ninguém que reze por elas

Lembremo-nos nós por amor e caridade!”

Pai Nosso, Avé Maria


Também ao longo da Romaria, outras situações ocorrem: passando-se ou avistando-se uma Igreja ou Ermida, invoca-se o seu orago (o patrono), ou sempre que algum momento se justificar, levanta-se a «Salva», fazendo-o sem preconceito, por tratar-se de um acto de em que confiamos e acreditamos, no poder da nossa «Oração» para que a mesma possa contribuir para o bem da causa e da humanidade que evocamos.

Neste 2.º Dia de Romaria, vivemo-la sempre com toda intensidade, aliás, como sempre ocorre ao longo dos demais dias do nosso caminhar quaresmal, são momentos grandiosos que sinalizo:

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