Segunda-feira da III Semana da Quaresma
O Senhor disse, na iminência da Paixão: «Agora será lançado fora o
príncipe deste mundo, e eu, quando for levantado da terra, todas as coisas
atrairei a mim mesmo» (Jo 12, 31). Ora, o Senhor foi levantado da terra
pela Paixão da cruz. Logo, por ela o diabo foi privado do seu poder sobre os
homens.
Sobre o poder que o diabo exercia sobre os homens, antes da Paixão de
Cristo, devemos fazer tríplice consideração:
1. A primeira, relativa ao homem, que pelo seu pecado mereceu ser
entregue ao poder do diabo, por cuja tentação fora vencido;
2. A outra, relativa a Deus, a quem o homem ofendera pecando, e que na
sua justiça abandonou o homem ao poder do diabo.
3. A terceira é relativa ao diabo, que com sua vontade perversíssima
impedia o homem de alcançar a sua salvação.
Assim, pois, no tocante à primeira consideração, o homem foi libertado
do poder do diabo pela Paixão de Cristo, porque a Paixão de Cristo é a
causa da remissão dos pecados.
Quanto à segunda, a Paixão de Cristo nos livrou do poder do diabo, por
nos ter reconciliado com Deus.
No tocante à terceira, a Paixão de Cristo nos liberou do diabo, porque
nela o diabo ultrapassou a medida do poder que Deus lhe conferira,
maquinando a morte de Cristo, que não merecera morte por não ter
nenhum pecado. Donde o dizer Agostinho: «Pela justiça de Cristo foi
vencido o diabo, porque apesar de nada ter encontrado nele digno de
morte, contudo o matou. E portanto era justo que os devedores que detinha
em seu poder fossem mandados livres, crentes em Cristo, que o diabo
matou, apesar de não ter nenhum débito.»
É verdade que o diabo pode, ainda agora, com a permissão de Deus,
tentar os homens na alma e vexar-lhes o corpo; contudo, foi-lhe preparado
ao homem o remédio da Paixão de Cristo, com o qual pode defender-se
contra os ataques do inimigo, a fim de não ser arrastado à perdição da morte
eterna. E todo os que, antes da Paixão, resistiam ao diabo, assim o
puderam fazer pela fé na Paixão de Cristo. Embora, não estando essa
Paixão ainda consumada, de certo modo ninguém pudesse escapar às mãos
do diabo, livrando-se assim de descer ao inferno; ao passo que depois da
Paixão de Cristo todos podemos nos defender contra o poder diabólico.
Deus permite ao diabo enganar certas pessoas, em certos tempos e
lugares, por uma razão oculta dos seus juízos. Mas sempre, pela Paixão
de Cristo está preparado aos homens o remédio para se defenderem das
perversidades dos demônios, mesmo no tempo do Anticristo. E o fato de
certos descuidarem de servir-se desse remédio em nada faz diminuir a
eficácia da Paixão de Cristo.
III, q. XLIX, a. II
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)
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