quinta-feira da I semana da Paixão
Aparentemente, a maior prova do amor de Cristo por nós foi o ter dado seu
corpo como alimento, e não o ter sofrido por nós, pois a caridade da Pátria é
mais perfeita que a caridade da Via. Ora, este benefício com que Deus nos
agraciou, ao nos dar seu corpo como alimento, é mais similar à caridade da
Pátria, onde gozaremos plenamente de Deus, enquanto a Paixão a que Cristo
se submeteu mais se assemelha à caridade da Via, onde nos expomos a
morrer por Cristo. Assim, pois, a maior prova de amor de Cristo seria o ter
nos dado seu corpo como alimento, e não o ter sofrido por nós.
Contudo, lemos no Evangelho (Jo 15, 13): "Não há maior amor do que dar a
própria vida pelos seus amigos".
Solução: No que diz respeito ao amor humano, nada ultrapassa o amor com
que nos amamos a nós mesmos, por isso este amor é a medida de todo amor
que sentimos pelos demais. Ora, o característico do amor com que nos
amamos a nós mesmos, é o querer o bem a nós mesmos. Portanto, o amor
ao próximo será tanto mais evidente quanto mais preterirmos em seu
proveito o bem que desejamos para nós, como aquilo das Escrituras (Pr 12,
26): "Aquele que por amor do seu amigo não repara em sofrer alguma perda, é
justo".
Ora, o homem quer para si mesmo um triplo bem particular: sua alma, seu
corpo, os bens exteriores.
Suportar algum prejuízo nos bens exteriores por causa de outrem é sinal
de amor.
Sofrer corporalmente por outrem, em trabalhos ou agressões, é sinal
ainda maior de amor.
Contudo, abandonar sua alma e morrer pelo amigo, eis o sinal máximo
de amor.
Assim, ao sofrer e morrer por nós, Cristo nos deu a maior prova de seu
amor. Ao nos dar seu próprio corpo como alimento, o fez sem nenhum
detrimento próprio.
A Paixão é a maior prova do amor de Deus. Por isso a Eucaristia é memorial
e figura da Paixão de Cristo. Ora, a verdade se superpõe à figura e a
realidade, ao memorial.
A produção do corpo de Cristo no Santo Sacramento é figura do amor com
que Deus nos ama na Pátria; mas a Paixão de Cristo pertence ao amor
mesmo de Deus, que nos tirou da perdição para nos levar a si. O amor de
Deus não é maior no céu que no presente.
Quodl. V, q. III, a. II.
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