"Havia medo e não pouco. Os acontecimentos precipitaram-se. Tornou-se difícil distinguir amigos de inimigos. Testemunhas de acusação eram às centenas. Uma espécie de fenómeno misterioso se apoderou dentro e fora. Deixou mesmo de haver dentro e fora. Apenas multidão, povo, plebe. Entusiasta junto às portas de David, trajou-se de crueldade junto aos portões de Pilatos.
Os discípulos caíram no sono profundo de quem se coloca fora de cena. Pedro – de quem se havia escutado as palavras mais sublimes sobre Jesus – não escapa ao espectáculo de cobardia e indiferença perante a prisão e aviltamento do Mestre de palavra eterna. Só, rigorosamente só, Jesus teve de ir do Getsémani ao Calvário, apenas sob o insulto e o chicote. Um olhar enternecido de mulheres, a presença da Mãe à distância consentida, o arrastamento infindo de correntes, cruz e os farrapos humanos que lhe restavam. Nem um momento de quietude. Nem um vislumbre de luz. O céu e a terra adensavam numa espécie de marcha fúnebre em memória dum condenado sem glória nem retorno.
Por isso os apóstolos trancaram as portas com medo. Nada estava concluído apesar de Jesus dizer que “tudo está consumado”.
Apenas estranhos como o Centurião e Nicodemos trabalhavam na sombra a convicção de que ali não estava o fim. Um dos ladrões também, mas tinha partido. Um silêncio descrente se apoderou de todos, inclusive dos que desconfiavam dos guardas do túmulo que poderiam deixar escapar, por roubo, o corpo desse Nazareno que veio roubar a tranquilidade à cidade ocupada onde pouco acontecia. Outra vez fora adiada a vinda do Messias.
Estavam por isso bem cerradas as portas. E o Ressuscitado apareceu: a paz esteja convosco.
Hoje como há dois mil anos. Em ambiente de descrença e dúvida sobre Jesus, a Igreja, os sucessores de Pedro. Mesmo conscientes do seu pecado, os que seguiram Jesus continuam, vinte séculos depois, a celebrar convictamente a ressurreição. Na verdade Ele venceu a morte. E todo o mal. E todas as mortes. Por isso os seus discípulos não têm razão, hoje como ontem, de trancar as portas com medo."
Os discípulos caíram no sono profundo de quem se coloca fora de cena. Pedro – de quem se havia escutado as palavras mais sublimes sobre Jesus – não escapa ao espectáculo de cobardia e indiferença perante a prisão e aviltamento do Mestre de palavra eterna. Só, rigorosamente só, Jesus teve de ir do Getsémani ao Calvário, apenas sob o insulto e o chicote. Um olhar enternecido de mulheres, a presença da Mãe à distância consentida, o arrastamento infindo de correntes, cruz e os farrapos humanos que lhe restavam. Nem um momento de quietude. Nem um vislumbre de luz. O céu e a terra adensavam numa espécie de marcha fúnebre em memória dum condenado sem glória nem retorno.
Por isso os apóstolos trancaram as portas com medo. Nada estava concluído apesar de Jesus dizer que “tudo está consumado”.
Apenas estranhos como o Centurião e Nicodemos trabalhavam na sombra a convicção de que ali não estava o fim. Um dos ladrões também, mas tinha partido. Um silêncio descrente se apoderou de todos, inclusive dos que desconfiavam dos guardas do túmulo que poderiam deixar escapar, por roubo, o corpo desse Nazareno que veio roubar a tranquilidade à cidade ocupada onde pouco acontecia. Outra vez fora adiada a vinda do Messias.
Estavam por isso bem cerradas as portas. E o Ressuscitado apareceu: a paz esteja convosco.
Hoje como há dois mil anos. Em ambiente de descrença e dúvida sobre Jesus, a Igreja, os sucessores de Pedro. Mesmo conscientes do seu pecado, os que seguiram Jesus continuam, vinte séculos depois, a celebrar convictamente a ressurreição. Na verdade Ele venceu a morte. E todo o mal. E todas as mortes. Por isso os seus discípulos não têm razão, hoje como ontem, de trancar as portas com medo."
Artigo publicado no Jornal "A União" de 31 do mês findo da autoria de António Rego
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